Através da história, as pessoas têm tentado distinguir ou reconciliar entre a Vontade Divina e o livre arbítrio humano. Alguns têm negado o livre arbítrio, enquanto outros têm alegado que nós criamos os nossos próprios atos e, portanto, ignoram o Destino. Porém, como o Islam é o método do meio de tudo, ele proclama que o Destino Divino domina a existência, incluindo o reino humano, mas que podemos usar o nosso livre arbítrio para dirigir as nossas vidas.
O Alcorão expressa a verdadeira natureza dessa relação da seguinte forma: “Certamente, isto não é mais do que uma mensagem para o universo, para quem de vós se quiser encaminhar. Porém, não vos encaminhareis, salvo se Allah, o Senhor do Universo, assim o permitir.” (81:27-29). Os versículos atribuem a absoluta vontade de Allah, o Todo-Poderoso, mas não negam o livre arbítrio humano. Em outro versículo, lemos que Allah criou você e a tudo o que você faz (37:96). Outros versículos falam de um convênio entre nós e Allah, e abertamente fala que nós dirigimos a história: “Cumpri o vosso compromisso, que cumprirei o Meu compromisso, e temei somente a Mim.” (2:40). Se vocês auxiliarem a religião de Allah: “Ele vos socorrerá e firmará os vossos passos” (47:7), e “Ele jamais mudará as condições que concedeu às pessoas, a menos que elas mudem o que há em seus íntimos.” (13:11).
Com exceção do gênio e humanos que possuem livre arbítrio e devem prestar contas de seus atos, o Destino Divino é o único absolutamente fator dominante na existência. Para conciliar entre o Destino e o livre arbítrio humano, considere o seguinte:
• O Destino é um título para o Conhecimento Divino. O Conhecimento de Allah compreende tudo entre e além do tempo e espaço. Se o seu conhecimento permite a você conhecer de antemão que certa coisa irá acontecer num certo tempo no futuro, a sua “predição” será verdadeira. Mas isso não significa que o seu pré-conhecimento a faz acontecer. Uma vez que cada coisa e evento são compreendidos no Conhecimento de Allah, Ele escreve o que acontecerá num dado tempo e espaço, e isso acontece. O que Allah escreve e o que nós fazemos são exatamente os mesmos; não porque Allah o escreve e então nos força a fazê-lo, mas porque nós o desejamos e então o fazemos.
Por exemplo: Um trem viaja entre São Paulo e Rio. Considerando sua velocidade e características, as condições da estrada de ferro, a distância entre as duas cidades, bem como o número de estações ao longo do caminho e quanto tempo será gasto em cada uma delas, um horário pode ser preparado. Será que o horário faz o trem viajar?
O tempo e a duração dos eclipses solar e lunar são conhecidos e registrados de antemão com base em cálculos astronômicos. Será que esse pré-conhecimento e o seu registro causam os eclipses? Certamente que não! Uma vez que os astrônomos conhecem de antemão quando o eclipse ocorrerá, eles o registram. A mesma relação existe entre o Destino e o livre arbítrio humano. • O nosso livre arbítrio está incluído no Destino. Por exemplo, alguém pergunta a você se o relógio no outro compartimento está trabalhando. Você o ouve e responde afirmativamente. O questionador não precisa perguntar se os seus ponteiros estão se movendo, uma vez que se o relógio está trabalhando, suas engrenagens estão trabalhando e seus ponteiros estão se movendo. Em uma analogia, o Destino e o livre arbítrio humano não são mutuamente exclusivos. Não somos nem folhas secas sopradas pelo vento do Destino nem completamente independente dele. Como o Islam sempre segue o meio termo, ele explica a verdadeira relação entre o Destino e o nosso livre arbítrio: Nós temos vontade e fazemos algo, e Allah cria-o.
• Do ponto de vista do Destino, causa e efeito não podem se separar. É destinado que essa causa irá produzir aquele efeito. Mas, nós não podemos arguir que matar alguém é correto porque a vítima estava destinada a morrer naquele tempo e lugar, e teria morrido de qualquer forma mesmo se ela não tivesse sido baleada. Tal argumento é sem base, uma vez que a vítima é realmente destinada a morrer como o resultado de ser baleada. O argumento que a vítima teria morrido mesmo sem ser baleada pode significar que essa morte foi sem sentido. Como podemos explicar essa morte? Lembre-se que não há dois tipos de Destino, um para a causa e outro para o efeito. O Destino é um só.
• As pessoas são inclinadas à imaginação, excluindo-se da passagem do tempo, um limite para o tempo passado estendido através de certa corrente de coisas. Eles chamam isso de azal (eternidade passada). Mas raciocinar de acordo com tal ideia é inaceitável. Para compreender esse sutil ponto melhor, considere o seguinte: Imagine que você esteja segurando um espelho na mão. Tudo que é refletido do lado direito representa o passado, enquanto tudo que é refletido do lado esquerdo representa o futuro. O espelho consegue refletir apenas uma direção, uma vez que não consegue mostrar ambos os lados de uma vez, enquanto estiver segurando-o. Se você quiser ver ambas as direções simultaneamente, deve elevar bem alto a sua posição original que o esquerdo e o direito se unem numa só direção e nada podia ser chamado de primeiro e último, começo e fim. O Destino Divino, em alguns aspectos idênticos ao Conhecimento Divino, é descrito numa tradição profética como contendo todo o tempo e os eventos como um ponto único, onde o primeiro e o último, o início e o fim, o que aconteceu e o que acontecerá, todos estão unidos num só. Como não somos excluídos dele, nossa compreensão do tempo e dos eventos poderia ser como o espelho para o passado.24
• Nós não criamos os nossos atos. Se geralmente fazemos isso, também teríamos de ser sua causa última. Se esse for o caso, não teríamos livre arbítrio, uma vez que, de acordo com a lógica, uma coisa existe se a sua existência é absolutamente necessária e todas as condições necessárias são preparadas para a sua existência. Assim, o que venha a existir deve ter uma causa completa e real. Mas uma causa completa pode tornar a existência de algo compulsório, significando que não haveria lugar para escolha.
• Apesar de o nosso livre arbítrio não consegue causar o acontecimento de nada, o Todo-Poderoso Allah tornou a sua operação uma simples condição para colocar a Sua Vontade Universal em funcionamento. Ele usa o nosso livre arbítrio para nos guiar na direção escolhida por nós, assim somos responsáveis pelas nossas ações. Se você coloca a sua filha sobre seus ombros e, atendendo ao seu pedido, você a tira fora, ela pode ficar resfriada. Pode ela censurá-lo pelo seu resfriado? Certamente, você deve puni-la pelo seu pedido. De uma maneira similar, o Todo- Poderoso Allah, o mais Justo dos juízes, nunca força Seus servos a fazer nada e assim tornou a Sua Vontade de uma forma dependente do livre arbítrio humano.
Devemos sumarizar a discussão por enquanto em sete pontos:
1. O Destino Divino, também chamado de determinação e arranjo Divino, domina o universo, mas não cancela ou nega o nosso livro arbítrio.
2. Uma vez que Allah está além de tempo e espaço e tudo está incluído no Seu Conhecimento, Ele abrange o passado, o presente e o futuro como um indivisível e unido ponto. Por exemplo, se você estiver num compartimento, a sua visão fica restrita ao compartimento. Se você olhar de um ponto mais alto, você vê toda a cidade. À medida que sobe mais e mais, a sua visão continua a aumentar. A terra, quando vista da lua, parece ser uma pequena bola de golfe azul. O mesmo se dá com o tempo.
3. Uma vez que todo o tempo e espaço estão incluídos no Conhecimento de Allah como um único ponto, Allah registrou tudo que virá a acontecer até o Dia do Juízo. Os anjos utilizam esses registros para prepararem um registro menor para cada indivíduo.
4. Nós não fazemos algo porque Allah o registrou; Allah conhecia de antemão o que faríamos e registrou-o.
5. Não há dois destinos: um para a causa e o outro para o efeito. O Destino é um e refere-se simultaneamente à causa e o efeito. O nosso livre arbítrio, que causa os nossos atos, está incluído no Destino.
6. Allah nos guia para as coisas e ações boas, e permite e adverte-nos usar a nossa força de vontade para o bem. Em troca, Ele promete-nos felicidade eterna e o Paraíso.
7. Temos livre arbítrio, apesar de não contribuirmos em quase nada para os nossos bons atos. O nosso livre arbítrio, se não for utilizado adequadamente, pode nos destruir. Portanto, devemos usá-lo para o nosso benefício, orando a Allah. Isso tornará possível para nós desfrutar a graça do Paraíso, fruto da corrente das boas ações, e obter felicidade eterna. Além disso, devemos sempre procurar o perdão de Allah conseguindo, assim, refrear-nos do mal e sermos salvos do tormento do Inferno, fruto da condenável corrente de maus atos. Oração e confiança em Allah fortalecem imensamente a nossa inclinação para o bem, e o arrependimento e à procura do perdão de Allah enfraquecem sobejamente, e mesmo destroem, a nossa inclinação para o mal e a transgressão.
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